COMO TU PODES TER FALTA DE ALGO QUE NUNCA TEVE? -História de um diálogo em transição.


O Brasil está vivendo uma fase de transição cultural. Significa que os velhos modelos não funcionam mais; para uma boa parte da população esses padrões não são mais atuais e nem sequer reconhecidos como certos. Porem tem inércias e resistências que ainda fazem que estejam perpetrados. Inclusive porque ainda não se consolidaram, e as vezes nem criaram, modelos substitutivos novos. Essa fase da mudança, onde o velho não funciona mais e o novo demora para tomar conta, é geralmente muito perturbadora e sofrida, seja de um ponto de vista social que psicológico: intimo. A maior razão em culturas coletivas onde as pessoas não estão acostumadas a ficar sozinhas, no vazio ou conceber-se como protagonistas ativas de si mesmas e dos próprios contextos, demandando o próprio destino (presente e futuro) aos pais, ao estado ou a Deus. 
Essa não é teoria. Essa fase fase de transição brota na pele das pessoas, e as vezes a rasga, todos os dias e em vários campos. 

Vou fazer um exemplo. Imaginem um dialogo (imaginário e possível) entre um psicólogo e uma paciente. 

Ela: “Dr.não aguento mais. Ele não me dá bola. Nem carinho. Não conversamos mais. Nunca tem tempo para mim. É só trabalho. Ou amigos. Está sempre fora. Ou no whatsApp. Mas cobra. Sempre. Estou sempre errada. Ele paga. Ele reclama. Cobra tudo. Inclusive o sexo. Que pretende. Que nem mais é bom. A minha pele se contrai. A minha alma se recusa. Choro. Mas ele não vê. Talvez nem se importa. Me sinto presa. Não aguento mais. Falei que quero deixa-lo. Surtou. Se tornou violento. Me acusou ter outro. Não sei o que fazer”.

PSIC: “Entendo. Tudo isso não é culpa sua. E até um ponto não é nem totalmente culpa dele. Essa é uma sociedade da HONRA e da VERGONHA. Para a maioria dos homens, ainda hoje, a mulher é uma propriedade pessoal; um direito que se compra pagando. Embora isso seja chamado de providenciar. Algo aceitado pôr a mulher também. Que nunca arriscou do confiar na própria autonomia para quebrar esse paradigma. Mas o que consegue é que o casal se torna assim um produto social. Ou seja, ele está despreparado a entrar em relação com a mulher mas tê-la é a medida do valor de ser homem perante os outros. Ser deixado significa fracassar e passar vergonha. Não é aceitável. Por isso o fracasso não pode depender dele, que provavelmente sempre foi incensado da mãe e dos pais. A culpa, no estado da desconfiança e do paternalismo, é dos outros: de alguém que rouba. Que rouba você dele. Uma ideia que ao mesmo tempo o vitimiza e o salva. E que pode ser lavada por meio da agressividade. E também depende das mulheres, que se confiassem um pouco mais em si mesmas, assumindo o próprio direito em serem felizes autonomamente, cortando o que não é bom, despertariam o desafio e a ambição em serem relacionalmente melhores.

Mas o ponto é outro: se tu estás aqui é porque ainda quer fazer alguma coisa. Deixa-me intender: tu não tens coragem para deixa-lo ou quer ainda ficar com ele?”

Ela: “Não sei doutor. É que quando a gente briga e nos afastamos eu acabo tendo saudade. Me sinto sozinha. Eu gosto dele. A gente quando se dá bem se dá bem. Gostamos as mesmas coisas. Filmes. Conversar tomando chimarrão. Eu gosto dele .... “

Pisc.: “Mmmhhh … deixa me intender. Tu tens amigas?”

Ela: “Tenho”

PSIC.: “Bom, imagina que umas delas tenham maridos queridos, presentes, atenciosos, que as respeitam na maneira concordada, que os dois querem. Ok? Consegue imaginar? Beleza. 
Agora, imagina que você pudesse ter um homem assim. Que chegasse esse cara e quisesse ficar contigo. Nesse caso você o recusaria e continuaria escolhendo o seu atual namorado?”

Ela: “ah não”

PSIC: “Pronto!!

Essa é a diferencia entre amor e carencia. Confiança em si mesma e medo. Direito em ser feliz e entrega ao sofrimento.
Não posso arranjar um homem para ti nem mudar o seu namorado que não é meu paciente. Mas posso te ajudar a não ser presa dentro a sua própria carência. Ou pode continuar tendo a mesma vida, reclamado das mesmas coisas que determina e aceita. 

A escolha é sua.”


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