LIGAÇÃO ENTRE NATAL, CONSUMISMO E DEPRESSÃO – AS ORIGENS
O que liga Natal, consumismo e depressão? Desenvolvemos o
assunto em duas colunas consecutivas enquanto, pertencendo todos nós, é
importante compreender. Hoje começamos abordando as verdadeiras origens do
Natal e do seu aspecto de consumismo. No próximo a depressão e seus remédios.
Vamos começar por dizer que o Natal é uma celebração
reinventada. Do que hoje muitos se queixam, males e excessos, representam de fato
a sua tradição mais genuína. Os valores cristãos e de família são recentes,
chegaram depois. De fato, a história do Natal é uma história de conflitos de
classe e religiosos. Dezembro sempre foi um período de férias importantes, relacionado
com o solstício de inverno e com o final da colheita: período de grandes
excessos e transgressões de comida, álcool e, graças à pausa forçada dos
campos, de sexo. Hoje é um fato adquirido que a comida está disponível durante
todo o ano, mas isso é verdade só para os últimos dois séculos. Antes que foram
inventadas as geladeiras, dezembro era o único mês em que na Europa se podia
ter carne fresca, cerveja, vinho e produtos da campo disponíveis em grandes
quantidades. Até mesmo aos escravos eram dado um período de descanso. Capotando
a hierarquia social, os anfitriões partilharam as suas riquezas com os escravos
e os serviram. Estes, por sua vez, poderiam reivindicar vigorosamente
"presentes" dos ricos. Em troca, o pobre oferecia algo valioso para
uma sociedade baseada em paternalismo: a sua benevolência. Tudo era sem regras,
sem inibições. Um caos controlado. Aceito também porque considerado uma válvula
de segurança para conter o ódio de classe.
A partir do quarto século os cristãos começaram a celebrar
o nascimento de Jesus e a igreja tentou apropriar-se da festa, em consonância
com o princípio missionário, flanqueando a festividade religiosa aquela pagã mas,
sendo uma minoria, nunca foram capazes de controlar plenamente o jeito da
festividade a ser vivida. As velhas tradições estavam profundamente enraizadas
na cultura popular e nas mentes das pessoas e a Igreja nunca conseguiu mudá-las
completamente. As duas continuaram a coexistir, mesmo que com dificuldade, às
vezes discordando abertamente, até chegar com a Reforma em 1647 a declarar o
Natal ilegal porque papista e pagã.
Porém, com o nascimento do capitalismo moderno tudo mudou.
Como? Os bairros e o Natal começaram a distinguir-se por classe social.
Enquanto o rico retirara-se em seu enclave de luxo criado para se destacar dos
proletários vizinhos, a comemoração se transformou em luta de classes e danos
materiais. Inaceitável para a nova sociedade baseada sobre o valor da
propriedade. Além disso não era mais possível pelas novas fabricas permitir-se
funcionários encostados por um inteiro mês.
E ai a virada.
Entre 1810 e 1830, foi
criado por um grupo de nova iorquinos um novo conceito de Natal e com isso a
sua figura mais lendária: Papai Noel. O novo se comemorava em casa e não requeria
aos ricos a abertura de suas portas. De um lado, pela primeira vez, se exclui o
mundo exterior. Por outro, sendo uma festa dedicada às crianças, continuava
repetindo o antigo padrão: Quem tem a autoridade dá presentes para os menores
porem não mais em termos de classe mas de organização familiar. Lembro que as
crianças do século XIX cresceram com os funcionários e pertenciam ao nível mais
baixo da escada social. Há, portanto, uma réplica da antiga hierarquia, não
mais ricos para os pobres, mas quem tem o poder para quem não. Psicologicamente
isso parece satisfazer a velha necessidade sem o receio de ter que abrir as portas.
E este é o ponto em que coloca-se a semente do consumismo.
Não estava certo dar aos seus filhos as mesmas coisas que aos mendigos. Por
isso, teve-se que comprar e gastar. De fato o Natal ajudou a criar a moderna
sociedade de consumo, porque até aquele momento as pessoas não estavam
acostumadas a comprar bens de luxo. Mas a essência do típico presente de Natal
é que deve ter algo não necessário; na família deve ser algo especial. As
únicas pessoas para que ainda se dão coisas necessárias são os pobres.
Consequência e solução? Comprar, comprar, comprar.
Claro, não há dois países que celebram na mesma maneira o
Natal, mas não há nenhum país que tenha escapado do Papai Noel, onipresente nas
propagandas. Os presentes devem ser comprados. E aqui reside a maior
transformação: na figura benevolente do Papai Noel, a comercialização do Natal
tem sida escondida por trás dos mais ternos sentimentos de paternidade. Um “verdadeiro
milagre” para as vendas.
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