Eu sou um fracassado


Gosto fazer uma pergunta às pessoas: “Qual é seu sonho?” Semana passada, todos os adolescentes para os quais perguntei me deram a mesma resposta: “Quero ser milionário; quero ser muito rico”. Quero dizer: adolescentes!!! E aí, a geral atenção que reservo ao mundo, virou preocupação. Grande. 

Nesse Brasil atual, o Brasil do “eu quero sempre mais”; um Brasil vigoréxico onde “todos sabem tudo” e tem sempre “algo para ensinar”; nesse Brasil onde se estuda na ilusão que um diploma seja uma precondição de riqueza; nesse Brasil onde corpo e dinheiro têm conotações morais, enobrecendo até mesmo se de plástica ou roubado, e o carro é o templo do ego social; onde o relacionamento é um dispositivo contra a solidão ou contingência hormonal e os filhos propriedade; nesse Brasil que funciona por comparações, desembrulhando-se entre honra e vergonha; nesse Brasil oligárquico, não de todos, mas de muitos, a pergunta vem espontânea: 

“O que é o sucesso? O que o fracasso?”. E, acima de tudo, como se lida com o fracasso?

As pessoas estão aterrorizadas pelo insucesso: o fracasso é interpretado como uma derrota, como a prova de seu próprio valor pequeno; como um bom motivo para ser "marginalizados" por outros. 

A recusa por alguém e o fracasso de uma história de amor, por exemplo, causam uma enorme dor: provavelmente uma das maiores dores que se pode experimentar na vida.
Tem pessoas que ficam em relações erradas, que não têm mais nada para oferecer para as suas vidas e que, de fato, tornaram-se armadilhas reais; porem não saem; não querem fechá-las. E, isso só porque seria considerado um fracasso.
Há casamentos "clinicamente mortos” há anos, mas, os cônjuges recusam a formalizar o que consideram um fracasso pessoal.

É bem assim: muitas histórias arrastam indefinidamente, porque os dois parceiros têm medo da solidão ou do futuro incerto: as duas condições vividas como piores do que a "certeza" de um longo sofrimento já conhecido. Muitos casais ficam juntos apenas porque a separação é interpretada como uma incapacidade pessoal, como uma demonstração de incompetência, como um limite. Ao invés, muitas vezes, é uma conquista.
O mesmo também acontece frequentemente no início de uma relação ou mesmo na fase de corte. Muitas pessoas “decidem” que querem começar um relacionamento com alguém, fixando-se para seduzir mesmo que eles sabem perfeitamente bem que não é a pessoa certa para eles. Não conseguir significaria perder: fracasso.

Mas atenção: lembro que o medo do fracasso não é prerrogativa exclusiva de histórias de amor. Como visto envolve: títulos, negócios (ou trabalho), "aparência" e até mesmo esporte. 

O ponto está em onde você pretende colocar a sua atenção. Se uma pessoa considera o "fracasso" um acontecimento excepcional que só acontece na vida das pessoas particularmente infelizes ou incapazes, é claro que irá experenciar qualquer fracasso com vergonha e a atribuir a uma dimensão da "tragédia”: o fim do mundo pessoal. 
Vai, por isso, se sentir particularmente "inadequada" e, em seguida, ter medo da crítica dos outros, vivendo o fracasso de maneira dramática, muito dolorosa, definitivamente sofrendo mais do que o necessário. Muitos recursos emocionais serão "bloqueados”, desperdiçando outras oportunidades de investimento energético, por exemplo, em um novo relacionamento ou trabalho. 

Mas, isso é cultural. Não natural. Nos USA por exemplo “tentar e errar” está mais liberado: faz parte do alcance do “sonho americano”. 


E de fato o fracasso faz parte da vida. É natural. 

Eu, por exemplo, me considero um fracassado: não sou rico, não tenho poder, faço muitos erros, e não me importa. Busco o que me faz sentir bem e me realiza. Continuo errando e recomeço, e tudo isso sem olhar os outros, sem inveja nem sequer esnobismo. Eu sou um fracassado. Porém, sinto-me livre e em paz. Será que não é um sucesso? 

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