Mobilidade urbana: o carro na cidade e na cabeça


Como já escrevi um dos principais fatores a serem considerados, a fim de entender uma cultura são a maneira de alocar o que espaço (arquitetura, urbanismo, infraestruturas, etc.) e a relação que as pessoas têm com o carro. O que muitas vezes foge é que esses aspectos, cultura, auto e cidade, estão fortemente interligados e interdependentes. 

O carro, em particular, determina e domina seja a estrutura da cidade (economia e urbanismo) que a do indivíduo (comportamentos e psicologia). Vamos ver como. As primeiras estradas para fins de mobilidade urbana foram construídas em 1836 na França para uso militar. Mas com a descoberta de petróleo, a consolidação da cadeia de montagem e, especialmente, a Segunda Guerra Mundial, foi decidido concentrar-se na produção do carro. 
Por quê?  Simples! Os fabricantes de automóveis e óleo eram os mesmos que produzidas armas e que controlavam, portanto, políticas e governos e que, dando-se conta de que outras guerras clássicas já não eram um negócio sustentável, tiveram que criar uma base econômica alternativa. Para conseguir isso era necessária uma mudança cultural importante, que foi desencadeada por duas linhas de ação: a) uma propaganda intensiva e total para fazer o carro um símbolo de poder e sedução; b) a construção planejada de infraestruturas finalizadas para incentivar ao uso do carro.

Tudo com a conivência dos governos, ou seja, por meio de financiamentos públicos, assim que garantir-se o apoio dos poderes econômicos fortes, nacionalizam as perdas e privatizam os lucros. Só para se tiver uma ideia, em 1992, um estudo da Probe Poluição calculou para o estado de Ontário $ 45 bilhões de subsídios públicos para: construção e manutenção de estradas, os custos dos juros da dívida pública, proteção da saúde, expropriações de terra, perdas de colheitas, feridos e mortes, e perdas para o ambiente e danos produtivos por atrasos. A estes devem ser adicionados os custos à que incide sobre os contribuintes para os acidentes rodoviários, polícia, hospitais, ambulâncias, bombeiros, etc. para um total de 8,5 bilhões. O retorno por meio de impostos foi de 3,85 para um prejuízo líquido de quase cinco bilhões.

O ponto é que com o carro, além das empresas de petróleo e fabricantes, ganham, graças à mobilidade da redução de espaço e do tempo de mudança, a economia do “tijolo” (os construtores podem vender o "longe" aos preços de "cidade") e, conseguintemente, os bancos.
Mas para ter mais e mais carros são necessários mais e mais estradas. E as estradas mudam radicalmente o conceito de espaço público e comportamento civil, individual e coletiva. O espaço público era o local de encontro e de desenvolvimento social, dando importância por isso a praças, mercados, atrações, etc. Tudo estava no publico. A casa era importante, mas apenas relacionado com as funções primarias.

Com o carro, o conceito de espaço público se deteriora progressivamente esvaziando-o de sentido e tornando-o morto, vazio, um "não-lugar". Dentro do bem particular-carro a cidade torna-se apenas um lugar de "travessia" para se deslocar de um ponto privado (a casa – lugar confortável e seguro) para outro (trabalho, escola, academia, a casa do 'amigo, etc.). Surge, portanto, reforçada pelo poder ostentoso e sedutor do material, o habito de andar com o carro e usá-lo por qualquer motivo e deslocamento.

Obviamente, isso vem incentivado e reforçado em um círculo vicioso de alienação e consumismo, a partir das políticas de planejamento urbano das infraestruturas. Quanto mais à cidade e suas ruas são destinadas aos carros, menos os são para as pessoas.

Um exemplo? Você se sente seguro em deixar seu filho brincar na rua? Onde é que podem sair os idosos?

Se a cidade não é para a pessoa, então o espaço público torna-se um perigo.
E o perigo empurra cada vez mais para retirar em privado. Em ficar nas casas; e comprar carros.

O medo, em geral, é um dos motores da economia de consumo: neste caso, aquela do carro, com o apoio das instituições públicas.

O conceito de risco aqui deve ser ampliado: não só acidentes físicos ou violência, mas também poluição, ruído, limitações ambientais e, sobretudo, o prejuízo no desenvolvimento cognitivo para as mesmas crianças que perdem de aprender a superar os desafios do espaço público por meio da socialização e confiança. Muitos estudos provam isso.

E ai a gente pede as varias administrações para responder, prevenir ou remediar a tudo isso.

Mas é um paradoxo. Como podem resolver-se as coisas se não a partir da uma mudança nos mesmos comportamentos da gente? Como resolver os problemas que nos criamos sem nos mudar? Como podem as cidades favorecer as pessoas se as mesmas pessoas escolhem e favorecer o carro?

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