A Praça é nossa

Do ponto de vista antropológico a maneira como o ser humano ocupa o espaço é um dos aspectos mais fascinantes da sua história de vida social. Os lugares falam sobre quem os habitam e os alteram em uma contínua estratificação de mudanças, sinais, valores e significados.

Em particular a praça fala da cidade. Ainda mais, tecnicamente é a sua origem. Historicamente as cidades nasceram como extensão da mesma praça, espaço encruzilhado de afluência em função de uma feira, em um progressivo aumento de exigências e construções ao seu redor (a diferencia das comunidades onde a origem/base é a propriedade fundiária e depois vem criado um lugar de encontro). A praça é o centro desta realidade: bem no centro, também por razões de segurança (assim que o ladrão não pudesse escapar); o lugar do desenvolvimento da vida pública; deposito arquitetônico e simbólico de sinais históricos e valores fundamentais da mesma concepção civil (poder, religião, comercio). É espaço aberto: para encontros, escambos, festas, manifestações, etc. É, portanto, o coração de uma cidade. É mãe. É movimento, circulação, real e simbólica (tanto que as cidades na origem eram circulares e concêntricas). E ir para o centro é, de certa forma, mesmo ir ao centro das coisas: ir a verdade. A praça é a cidade que está falando de si mesma, não apenas um simples "cartão de visita ", como declarou o nosso prefeito: comunica verdades que não se podem disfarçar.

Então que verdade a praça Walnir Battaro Daniel tem a dizer sobre a “cidade” São Miguel do Oeste? No primeiro que, culturalmente, não pode ser chamada de “cidade”. A WBD, de fato, declara e admite visivelmente que a atual administração não assume o legado da passada e que a passada não deixou condições para as futuras ou seja que o padrão de alternância entre os poderes públicos não visa o bem coletivo, mas o que de facção. Mas o fato de que os moradores assistam acostumados a anulação de seu centro, a sua degradação, ao depauperamento dos seus símbolos, ao seu silêncio, ao desperdiço, a sua eutanásia, reduzindo isso a uma simples questão política destaca dois aspectos que confirmam esta tese:

A) que a lógica do " cada um cuida do seu próprio " é uma mentalidade comum mais forte e mais enraizada do que a representação do bem coletivo. O "sacrifício" da praça legitima, assim, o princípio do esquema de funcionamento social em blocos, conforme a planta ortogonal da cidade dividida em quadras, ou seja, uma dimensão da vida pública-coletiva organizada por grupos e classes, onde no lugar da praça está a própria casa.

B) Que a permanência de uma praça fictícia e esquelética, sem sinais de reconhecimento, sem pontos de encontro (exceto a igreja), reduzida a uma mata de incompletude e pontos obscuros, não é vivida como uma mutilação da mesma identidade do cidadão e não afeta profundamente a sua dignidade (se não, não seria possível). Até a sua iluminação induz redução de vida pública. Mas a consequência de uma arquitetura de retração é plasmar uma sociedade dopada (Ruas vazias depois o trabalho e uso enorme de antidepressivos).
Quando cheguei aqui, a primeira coisa que fiz foi ir para o museu e para a praça, no centro da sua história, na verdade de sua vida. Tendo viajado muito, posso confirmar que uma das características das cidades do mundo é que os cidadãos não "vão para as ruas", mas "encontram-se nas ruas", porque, nas cidades, o centro é o coração e cada um se sente em casa na sua praça. Uma casa aberta, onde tudo é dialogado, misturado e pode acontecer: o bom e o ruim, como na vida. Uma atitude necessária para crescer.


Do ponto de vista sociológico, a alienação física e política da Walnir Battao Daniel revela que São Miguel do Oeste é uma cidade na demografia mas de fato um conglomerado de comunidades na cabeça dos moradores. Bem por isso aguenta ficar sem praça, com vários corpos mas sem um único coração. Mas até quando?



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