LEILOANDO O AMANHÃ

Os olhos de todo o mundo estão hoje apontados com trepidação sobre o leilão do Pré-Sal. Uma ocorrência de impacto extraordinariamente crucial. Em jogo não há apenas grandes interesses económicos quanto o realinhamento do eixo geopolítico do mundo que, obviamente, segue o poder da alimentação energética. De fato o Brasil está vendendo seu petróleo para os “outros”. Por quê? O que está por baixo? Dívida? Corrupção? Incapacidade técnica? Consequência da crise diplomática com o bloco neoliberal do FMI por causa da dura tensão política (espionagem) coeva com os EUA e a necessidade de se ligar a China sem entrar no OPEP?

Os números são impressionantes: reservas de 8 a 12 bilhões de barris de petróleo por uma área de 1500 Km. Investimentos de 185 bilhões US dólares em 35 anos; taxa de 5 bilhões de € a serem pagos ao governo, cujo pertencerá apenas o 40% do extrato; construção de 18 novas plataformas e 90 navios de apoio. O capital induzido pela Petrobras, financiado por meio de políticas de impostos. Esperavam-se 42 concorrentes (inscrição de 900.000 $). Registradas: 11. Recorrentes: Um. Consórcio vencedor: Petrobras, Shell, Total, CNOOC, CNPC

Não é apenas um acontecimento econômico mas uma verdadeira delicadíssima redefinição cultural global. Que precisa ser entendida. A Universidade Católica de Milão, por exemplo, pediu-me para dar uma web-aula para explicar esta virada crucial e crítica que está ocorrendo aqui, e que, sem meios termos, define (e sacrifica) hoje o futuro do Brasil, como destaca o ministro Lobao: “este leilão representou um ponto de viragem entre o passado e o futuro”.

Sem expatiate me muito sobre os aspectos econômicos (para um psicólogo abranger a economia é como para um pintor dominar a tela na qual desenha), aqui em ZF acho vale a pena destacar duas realidades inequívocas proeminentes desta profunda passagem cultural que o leilão declara. 


1) A instabilidade do modelo de política econômica post ditadura. Na década de 90 o governo abandonou o modelo de economia de Estado (Petrobras, Telebrás, Eletrobrás, etc.), típica dos modelos centrais e das ditaduras (o filósofo Hobbes chamou o Estado de monstro com poder absoluto sobre o indivíduo e abriu à privatização, continuando nestas empresas como minoritário principalmente por meio dos fundos de pensão e do Banco Nacional de Desenvolvimento Económico e Social (BNDES), que viraram grandes acionistas. Em seguida a tendência de encolhimento do Estado foi revertida. O BNDES passou a conceder financiamentos a juros camaradas para realizar fusões entre grandes empresas. A ideia básica era sacrificar a competição no mercado nacional e lançar produtos no exterior, o que raramente aconteceu (por exemplo foi o caso da Oi que surgiu após a compra da Brasil Telecom, e da BRE com a aquisição da Sadia pela Perdigão).
Com a Dilma, a intromissão estatal se acentuou. O objetivo era virar o jogo pra promover o mercado interno. Exemplos? Decidiu-se pela intervenção direta na Petrobras para conter o aumento no preço da gasolina; no setor bancário, obrigou a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil a cobrar juros mais baixos. Mas as ações caíram muito e as dívidas cresceram. As intervenções se tornaram sinônimo de negócio errado. O capital que foi emprestado não será produtivo e haverá problemas para recuperar os investimentos.
Estamos na direção da doença terminal da Argentina. O teste de logo será a inflação.

Por isso agora o leilão parece uma desesperado arrumo preventivo para dar um jeito imediato, no presente, as consequências dessa política de desenvolvimento econômico instável, sem planejamento, continuidade e proatividade.

2) Chegamos assim ao ponto 2. A escolha de arrumar o presente sacrificando o futuro, o famoso “quero tudo pra ontem”, por meio do leilão, está colocando o BR a admitir para o mundo uma mensagem de profunda desconfiança no futuro: O BR perde assim credibilidade: econômica, escolhendo o presente e política, aproximando-se a China.


Enfim, de fato o BR está agora leiloando o seu futuro, não apenas o seu petróleo!


Comentários

  1. Obrigado Deny Alfano pelos esclarecimentos feitos sobre o assunto que gerou uma grande perplexidade aos brasileiros e não só, pois, como estou a residir na Europa, com todas as pessoas que conversei sobre o assunto, o comentário foi único no sentido de que "o Brasil perdeu o rumo, não está nada bem e pior vai estar no futuro"... sentimento grande de impotência, revolta e fragilidade é o que sinto sobre o meu país.

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    1. Bom dia Anônimo europeio. Não tenho a presunção de poder "esclarecer" uma verdade ... é apenas a minha visão. Um jeito pessoal de entender as coisas. Mas, francamente, concordo com os comentários que você está escutando e compartilhando na Europa. Eu não vejo um futuro econômico rosa para o Brasil, mesmo tendo todas as potencialidades para tê-lo. O que geralmente falta é uma atitude cultural a planejar, renunciando a aproveitar o presente para construir um futuro.

      Mas porque preocupar-se do futuro quando no fundo das almas de cada nutre-se a confiança que tudo pode ir certo ... que com um jeitinho brasileiro tudo se pode sempre resolver .. e, mesmo assim, por as outras coisas .. fica tudo sob a vontade de Deus. Essa tendencia base, com certeza, não ajuda ou cria a cultura do planejamento. E a politica, simplesmente, reflete tudo isso.

      Um abraço pra você e para a bela Europa (que aposto vai sair da crise em 3 anos).

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  2. O artigo esclarece pontos essenciais da política e economia que a maioria das pessoas não sabe, ou não consegue fazer o Link entre a historia politica e economica, estatais e privatização, a intromissão estatal que se vê, hoje tem um projeto a longo prazo? a impressão que se tem é que o governo vai tapando furo aqui e ali, sem um projeto a longo prazo, pensando somente no aqui e agora, e em explorar o nosso tesouro, o máximo que puder enquanto estes governantes estão no poder.... o que vem depois não importa... e este dinheiro todo que entra quais são os planos?


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    1. Bom dia Anônimo. Concordo em destacar que o esquema é aquele do "tapando furo aqui e ali" mas, francamente, gostaria chamar a sua atenção sobre dois pontos:
      a) não leva a nada descarregar as responsabilidades sobre "os políticos". O habito geral de jogar todo sobre os políticos como se fossem "outra coisa respeito a si mesmos" é um processo de auto desculpa por meio de projeções bem conhecido em psicologia. se eu coloco o que não gosto de mim sobre uma outra realidade que não tem nada a ver comigo o que sobra é que eu permaneço completamente positivo (limpo) e a outra realidade totalmente negativa (suja). Mas esse processo reduz a ação baseada sobre a responsabilidade da mudança partindo da si mesmo. Os políticos não são uma criação genética alienígena outra respeito a cada brasileiro. São brasileiros como cada um, e repetem em um contexto politico o cada um age em um contexto diário;
      b) nessa linha eu vejo o esquema do "tapando furo aqui e ali", filho do famoso esquema, que já destaquei em outros artigos, "quero tudo por ontem", um esquema bem tipico e divulgado (genérico? cultural?). exemplos? quando as pessoas não recusam de comer ou não mudam os próprios hábitos alimentareis mas ao mesmo tempo não querem pagar as consequências (não querem ficar gordos) e recorrem a lipossução. Ou recorrem imediatamente a um remédio farmacológico por cada dor ou coisa que incomoda.

      Ou seja, tem duas características a base desses esquemas: não interligar causas e consequências (jeitinho brasileiro) e uma baixa limiar a frustração. esses traços culturais me parecem bem típicos dos "brasileiros" ..e nesse sentido a politica me parece apenas um espelho de tudo isso.

      o que acha senhor/senhora anonimo?

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/11/131107_petrobras_eike_editorial_ft_rw.shtml?ocid=socialflow_facebook_brasil

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